A palavra “orientalismo” é dicionarizada pela primeira vez em Portugal, de acordo com a investigação de Manuela Delgado Leão Ramos (António Feijó e Camilo Pessanha, 2001, pp. 18-19), no quarto volume do Grande Diccionario Portuguez; ou Thesouro da Lingua Portugueza, de 1873 – não por acaso data da realização do primeiro Congresso Internacional de Orientalistas, em Paris. Importada por via do Francês e mais especificamente, como bem sugere Ramos (Idem, p. 19), do dicionário de Émile Littré (1873-1874, p. 859), significava então “conjunto dos conhecimentos, das ideias filosóficas e costumes dos povos orientais.//Ciência dos orientalistas, conhecimento das línguas orientais”, sendo o orientalista “[h]omem versado n[esse] conhecimento” (Vieira, Grande Diccionario, 1873, p. 583). Se, por um lado, se define o orientalismo como um campo de estudo cujo objeto diversificado – as línguas, os costumes e as ideias dos povos do(s) Oriente(s) – o elevaria ao estatuto de ciência, por outro, e não menos relevante ainda que em consonância com a época, é associado a uma prática de género, o masculino, que dominará a produção discursiva sobre o Oriente em Portugal praticamente até ao final do século XX.
Esta definição aproxima-se da que o sanscritista Guilherme de Vasconcelos Abreu propôs na sua alocução aos membros da delegação portuguesa subscritora do primeiro Congresso dos Orientalistas para a constituição de uma Associação Promotora dos Estudos Orientais e Glóticos em Portugal. Visando propagar os estudos relativos ao Oriente, incluindo os da ciência da linguagem (glótica) e etnologia, esta Associação acolheria, como especifica no art.º 3 dos seus Estatutos, subscritos por A.A. Teixeira de Vasconcelos, Augusto Soromenho e Vasconcelos Abreu, “[t]odo o indivíduo, de qualquer sexo, que pretenda ser membro” (Correspondência... com J. Possidónio da Silva, 1874, vol. 7, doc. 986 bis). Esta abertura científica sem restrições de género ou classe profissional, pouco comum para a época, espelha bem a intencionalidade de congregar o maior número possível de nomes que visibilizassem uma comunidade orientalista de debate nacional. Esse esforço terá, no entanto, sido gorado, uma vez que só há registo de atividade da Associação entre 1874 e 1875 e não deixou obra digna de menção. Defende, então, o sanscritista que “o Orientalismo não é objeto de mera curiosidade; que não é assunto para entretenimento e ocupação de horas de ócio. O Orientalismo é a soma dos conhecimentos linguísticos, etnológicos e históricos acerca dos povos, do Oriente, antigos e modernos” (Exposição, 1874, pp. 8-9). Prescrevendo qualquer gesto de diletantismo incompatível com uma atitude científica, o orientalista especifica três tipos de saberes que combinados dariam uma visão mais completa de um objeto de estudo plural, que partilha uma mesma origem ou pertença geográfica singular – o Oriente (categoria determinada em função da posição do observador europeu) – e que não se ateria, porém, ao passado.