O historiador de arte Aarão de Lacerda nasceu a 23 de Março de 1890 na freguesia do Bonfim, no seio de uma família da elite burguesa portuense, cuja afirmação social se trilhara pelos caminhos da alta instrução. A mãe, D. Josefina Cândida Moreira de Lacerda, era filha de um reputado mestre régio de Lamego, enquanto o pai, Aarão Ferreira de Lacerda, doutor em Filosofia pela Universidade de Coimbra, era lente de Zoologia na Academia Politécnica do Porto, mais tarde reconduzido na nova Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Terá sido num ambiente privilegiado e de forte pendor cultural que o filho foi criado, frequentando o ensino primário e liceal na cidade, rumando a Coimbra para cursar a Faculdade de Direito, na qual obteve o grau de bacharel, com distinção, em 1912. Regressado à sua cidade natal foi nomeado 1.º oficial da Secretaria-Geral da Universidade do Porto e abriu o seu próprio escritório de advocacia, mas prontamente reconheceu que tal percurso não satisfazia a sua maior propensão para os estudos culturais e artísticos. Facto ao qual não seria alheio o seu convívio próximo com Joaquim de Vasconcelos e as tertúlias no círculo da Renascença Portuguesa, movimento que animava a vida intelectual do Porto em inícios do século XX, cruzando-se com diversas figuras de referência das letras e das artes que lhe foram moldando o seu pensamento e a exploração de novas áreas do saber.

Se Joaquim de Vasconcelos fora crucial no apuramento da sensibilidade artística e na introdução aos estudos científicos e críticos sobre a Arte desde a sua mocidade, também Leonardo Coimbra acentuaria a especulação filosófica com a aproximação à obra de Bergson e aos rumos da Estética, a par dos recentes conhecimentos evolutivos na Arqueologia e Etnografia, pelo núcleo da revista Portugália, que se entrosavam para uma melhor compreensão da Arte portuguesa. Assim, em 1916, Aarão de Lacerda regressava à Universidade de Coimbra, agora matriculado na Faculdade de Letras para cursar Ciências Históricas e Geográficas, cimentando a escolha da Estética e História da Arte como o seu domínio de especialização, cadeira que frequentou no último ano, sob orientação do Dr. Teixeira de Carvalho. Nas suas memórias não deixou de tecer fortes elogios a esse lente e a sua reverência pelo programa de estudos ministrado, um mentor pela sua erudição e abertura na discussão das questões estéticas e artísticas, resultando da ligação magistral entre ambos, em opinião de António Cruz, «o mais aproveitado dos discípulos de Quim Martins, o seu verdadeiro e fiel seguidor, o seu epígono» (“Aarão de Lacerda - o professor, o artista e o historiador da Arte”, 1984, p. 100).

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