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MARTINS, José Vitorino de Pina | |||||||||||||
Para entender a importância do legado intelectual de Pina Martins, é indispensável ter presente o contexto histórico em que a sua produção viu a luz. Numa época em que o acesso directo ao livro antigo nas bibliotecas e arquivos portugueses era extraordinariamente difícil, em que a liberdade de circulação entre países era coartada por entraves de natureza política e institucional, e em que a ideia de nação constituía um princípio basilar na arquitectura conceptual dos estudos históricos e literários, não só a visão integrada e dinâmica do espaço europeu que os seus trabalhos sobre iconografia e história do livro pressupõem, mas também a metodologia de investigação apoiada no exame físico directo das obras estudadas a que recorreu, constituíam excepção. Pode dizer-se que, nas décadas de 50, 60 e 70 do século XX, o investimento na abordagem científica, abrangente e transnacional do fenómeno literário, sustentada pelo exame directo de fontes primárias pressupunha, no âmbito dos Estudos Literários, uma ruptura com práticas e hábitos instalados. Essa atenção às fontes parece explicar os esforços realizados por Pina Martins para promover a difusão de textos fundamentais em edições fac-similadas, antecedidas de estudos críticos destinados a mostrar aos leitores a sua relevância cultural e bibliográfica, de que são exemplo, quer as publicações de obras curtas de autores como Boccaccio, Pico della Mirandola, D. Francisco Manuel de Melo, etc., que Pina Martins realizou na década de 60 em conjugação com a livraria ‘O Mundo do Livro’ quer as que promoveu enquanto responsável pelo serviço de publicações da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris e em Lisboa. Um dos estudos de fôlego mais relevantes levados a cabo por José V. de Pina Martins consistiu na proposta de revisão conceptual e periodológica da abordagem da cultura do Humanismo e do Renascimento proposta em 1948 por Ernst-Robert Curtius (1886-1956), consensual até então. O artigo “Humanismo e Renascimento. A propósito de um estudo de Ernst-Robert Curtius”estampado em1969, e o estudo “Sobre o conceito de Humanismo e alguns aspectos histórico-doutrinários da cultura renascentista” do ano seguinte, ancorados no conhecimento directo das fontes bibliográficas italianas, muito contribuíram para reformular o modo de encarar estas noções. Mas as pesquisas de Pina Martins sobre bibliografia material, cultura visual e história do livro – que estão na base das numerosas exposições bibliográficas e dos catálogos e inventários de livros antigos que coordenou –, a atenção particular que dedicou à história da transmissão textual das obras e à sua fortuna editorial, e até mesmo a familiaridade adquirida com a Cultura Italiana e com a Cultura Francesa estão na origem de outras tentativas de reconfiguração e de renovação de pontos de vista relativos à História Cultural portuguesa dos séculos XV e XVI. Nesta ordem de ideias, são de salientar estudos como Pico della Mirandola e o Humanismo italiano nas origens do Humanismo português (1964), O Livro Português no Reinado de D. Manuel I (1970), A iconografia do livro impresso em Portugal no tempo de Dürer (1972), Humanismo e Erasmismo na Cultura Portuguesa do século XVI (1973), Thomas More au Portugal (1983), assim como as propostas de renovação da periodologia da História da Literatura Portuguesa (observáveis, por exemplo, no estudo “Sá de Miranda and the reception of a revived ‘dolce stil nuovo’ in the sixteenth century“, de 1985), na reluctância em admitir a existência de um período maneirista na produção textual portuguesa de quinhentos (exposta no ensaio “Camões et la pensée platonicienne de la Renaissance” de 1972), ou mesmo na revisão das hipóteses avançadas até então pela crítica acerca da novela Menina e Moça de Bernardim Ribeiro, no alentado estudo que acompanha a edição fac-similada desse texto, dado ao prelo em 2002. |
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