No plano propriamente historiográfico, Álvaro Cunhal enuncia e fundamenta a tese de que em 1383 ocorreu, em Portugal, uma revolução burguesa. Embora esta interpretação já tivesse sido defendida, nomeadamente por António Sérgio, o dirigente comunista afasta-se dos argumentos por este aduzidos, que critica com veemência polémica.

De forma metódica, Cunhal caracteriza as diferentes classes sociais da época, que concebe como personagens históricas estruturais, para, de seguida, descrever o processo dramático que conduziu sucessivamente ao estado de crise no reinado de D. Fernando, à revolução burguesa e à aclamação do Mestre de Avis, bem como à posterior contrarrevolução aristocrática (e, mais tarde, à própria expansão). Num quadro de ascensão económica e social da burguesia, antes de mais, da burguesia urbana, mas também dos homens-bons dos concelhos e, ainda, do proletariado incipiente, a confluência de esforços teria feito valer, de forma revolucionária, os interesses comuns, enquanto a quebra posterior desta aliança viria proporcionar as condições que permitiram à nobreza fundiária reaver uma condição similar àquela que transitoriamente perdera.

No plano prático, ideológico e político imediato, a incursão historiográfica pelos finais do século XIV não se afasta em algum momento dos desígnios revolucionários do século XX: no domínio doutrinário, recapitula os princípios e corrobora a validade universal da codificação marxista; no âmbito do combate de ideias, contrapõe uma visão dialéctica dos anos de 1383-85 e dos fundamentos da expansão à historiografia e à mitologia monistas e nacionalistas; no foro partidário, constitui um exercício de aplicação de uma teoria social revolucionária e uma advertência face a desvios estratégicos ou tácticos conciliadores; no registo simbólico, cauciona o sucesso da acção política proletária com o exemplo da revolução burguesa, ambas progressistas, patrióticas, populares, com comando urbano e frente rural, igualmente sujeitas a evoluções bruscas e contraditórias. Em As Lutas de Classes em Portugal nos Fins da Idade Média não pode deixar de se ver ainda uma indicação de política cultural.

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