Boletim da Academia das Ciências de Lisboa, 2ª Série,
Coimbra e Lisboa, 1929 – 1977
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Ter-se-á dado uma espécie de reconciliação entre a vetusta academia e uma intelectualidade consagrada, simbiose que ainda hoje impera. Algo de semelhante – salvo anacronismos indevidos – ocorrera com a reforma estatutária de 1851-1852, que fez entrar ou singrar na ACL figuras como Alexandre Herculano e condiscípulos seus, permitindo, quase dez anos depois, o início das aulas do Curso Superior de Letras, antepassado da Faculdade de Letras de Lisboa.
Esta publicação é, em suma, um manancial de informação quanto à mobilidade e coexistência de intelectuais de elevada craveira cultural, com um rigor de datas de admissão, reprodução de pareceres e ascensão a diferentes graus académicos de que as publicações da ACL dos séculos XVIII e XIX careciam em suma medida, obrigando os estudiosos desses períodos a consideráveis esforços de busca e cruzamento de fontes (José Alberto Silva, Idem, pp. 61-67 e ss.). O mesmo sucederia com o Anuário Académico, publicado relativamente ao período de 1932 a 1978, numa tradição muito antiga, ainda proveniente dos Almanaques de Lisboa para o ano de… dos finais do século XVIII, embora aqui reduzidos à realidade da ACL. Por outro lado, não se vislumbram projectos individuais ou colectivos que, como em centúrias anteriores, conduzissem a instituição e os seus sócios em claros movimentos científicos de inovação e vanguarda, pelo menos nas áreas das humanidades e ciências sociais e humanas. Exceptuando – entre outros – os de António Ferrão, Avelino Teixeira da Mota ou Armando Cortesão, que no Boletim ensaiavam e comunicavam textos que mais tarde condensariam e desenvolveriam em volumes autónomos. Mas sem dúvida que a Academia ganhara já aquela pompa e circunstância, aquele respeito e amor pelo protocolo, aquela hierarquização social e profissional que consagra os homens de letras e de ciências, vivos e mortos, em momentos de evocação e de celebração do passado. Factores que progressivamente a afastaram de um estatuto de centro de investigação e de inovação que chegou a constituir, nos tempos idos de José Francisco Correia da Serra, António Caetano do Amaral, João Pedro Ribeiro, Alexandre Herculano e vários dos seus discípulos e colaboradores.
Tornaram-se, a ACL e o seu Boletim, áreas de consensos e não de dissensões, de discursos e aplausos e não tanto de debates e polémicas, pelo menos a ajuizar pelo tom geral presente em muitas das páginas deste seu órgão oficial de quase cinco décadas.