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A mais difundida, comentada, traduzida e criticada obra de Cerejeira, A Igreja e o Pensamento Contemporâneo (1924, com reedições em 1928, 1930, 1944 e 1953, traduzida para castelhano em 1945), embora alheia ao âmbito historiográfico, ajuda a compreender os vetores decisivos da sua historiografia. Mostram-no militante, um intelectual comprometido, podendo incluir-se na crítica que Julian Benda dirigiu, entre outros, a Henri Bergson, de cujas teses vitalistas e intuicionistas Cerejeira estava próximo, embora as considerasse insuficientes. Permitiam-lhe, porém, deslegitimar a pretensão totalizante da ideologia positivista, ao mesmo tempo que retinha do seu método o primado dos factos. Por essa via, buscava estabelecer com clareza as fronteiras entre a ciência e a religião, salvaguardando a autonomia de ambas e a sua necessária relação, o que lhe permitia sustentar a validade antropológica e social da religião – leia-se, do cristianismo e, particularmente, do catolicismo. Essa perspetiva tinha um correlato institucional, a necessária autonomia entre o Estado e a Igreja, claramente expresso no título de uma das partes de A Idade Média: «A originalidade histórica da Igreja: a «grande inovação» dum poder moral independente do Estado» (p. 293). Essa «cruzada intelectual» (Cf. Luís Salgado de Matos, Cardeal Cerejeira..., 2018, p. 30) destinada à «Reconquista Cristã do alto pensamento contemporâneo» tinha na obra de 1924 um cariz triunfalista. De modo mais circunspecto, mas não menos contundente, percebem-se esses elementos na sua tese de doutoramento. Clenardo proporcionava-lhe o ensejo para participar no debate que dividiu a intelectualidade portuguesa entre os finais do século XIX e os inícios do século seguinte: o das causas da decadência nacional. Escudando-se no percurso biográfico e intelectual do humanista flamengo, revelava autonomia crítica face à intervenção das estruturas eclesiais e políticas – a Inquisição sobre todas – o que lhe emprestaria maior legitimidade para apontar a insuficiência das teses anterianas, que explicitamente menciona. Aproximava-se, em sentido contrário, das leituras de Herculano, Oliveira Martins, Silva Cordeiro – que refere – e, sobretudo, de António Sérgio, que cita amiúde. Com Clenardo, Cerejeira sublinha que «razão profunda da nossa decadência» teria de ser encontrada nos «defeitos da estrutura económica e social» da sociedade portuguesa de Quinhentos, para o que terá contribuído o ideal de cavalaria, promotor do «horror» ao trabalho e da «mania nobiliárquica», que a dinâmica esclavagista teria agravado; além de moralmente reprovável, teriam sido perniciosos os seus efeitos verificados na ruina do trabalho livre, na corrupção dos costumes e na desorganização da família (Clenardo, pp. 197-210). |
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