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RODRIGUES, José Maria | |||||||||||||
JMR não ignorava em absoluto que, no âmbito de uma poética classicizante, a imitação e a emulação de modelos seria crucial. Esporadicamente, recorda Petrarca ou Sannazzaro. No entanto, a essa consciência sobrepôs o fascínio pela imitatio vitae. E porque, a seus olhos, a poesia lírica espelha a vida e Camões não canta senão “puras verdades”, à “tese da Infanta” subordinou a arquitectura da Lírica – uma edição que vãmente apelidou de “crítica” e que de novo contou com a cooperação de Afonso Lopes Vieira (1932). Se a ambição de reconstituir “uma espécie de vivíssimo diário” exigia a eliminação de apócrifos acumulados ao longo de séculos, o cunho vago e impressionista da triagem executada (“sujeitámos cada composição ao tríplice critério da qualidade da linguagem, do significado psicológico e do valor intrínseco” – p. XXX) desenha um círculo vicioso: subjacente à selecção e validando-a, a “tese da Infanta”… Contra este biografismo, manifestaram-se António Sérgio, Alfredo Pimenta ou Domingos Maurício, S.I.. JMR reagiria em “A tese da Infanta nas Líricas de Camões. Com uma carta de Afonso Lopes Vieira” (1933). Fiel ao seu hábito, conservou-se inabalável, sem questionar a subjectiva arbitrariedade das conjecturas que o impeliam a jogar com os textos como se fossem peças de um puzzle ou provas de uma intriga. JMR não foi um historiador. Verificamo-lo também pelos trabalhos que mais directamente se enquadram neste género: uma edição, em que terá intervindo na qualidade de filólogo (Registos Paroquiais da Sé de Tânger, 1922); intervenções de circunstância, onde perpassa a vontade de salientar Portugal, como “A propósito do Descobrimento da Austrália pelos Portugueses” (1931). JMR é alguém que não dispensa, no seu horizonte, a História como disciplina e saber nobre, par da Filologia ou da Geografia, e adjuvante na compreensão da Literatura. No entanto, a sua própria historicidade pode cegá-lo, como em “Sôbre a interpretação de um passo de «Os Lusíadas» (I, 6-7)” (1930). Que, na dedicatória da epopeia, D. Sebastião seja a “maravilha fatal da nossa idade,/ Dada ao mundo por Deus, que todo o mande” (I, 6), parece-lhe um erro editorial. Fechado na sua mundividência; alheio ao que, na retórica panegírica do proémio, infringia a sua doxa; desprezando a dimensão histórica da ideia de V Império, JMR classifica de “despautério” (p. 19) uma leitura que atribuísse a Camões “o que o simples bom senso lhe não permitiria escrever, isto é, que D. Sebastião foi dado ao mundo por Deus, para mandar todo o mundo.” (p. 18). Foi a medição do passado por critérios do presente que inclinou JMR a extrair conclusões erróneas, e paradoxalmente foi o seu empenho em considerar a Literatura como fenómeno histórico, enraizado numa realidade biográfica, que o conduziu ao maior dos equívocos. As fragilidades da sua obra valem como um aviso, a todos útil – aos historiadores também. |
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