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É tempo de falar do linguista, pois a ele se deve o maior número de aquisições que a ciência contabiliza no nome de Adolfo Coelho. No seu livro de estreia, o primeiro que Leite de Vasconcelos reconhece ter lido de linguística, por recomendação de seu mestre Epifânio da Silva Dias (dupla caução de autoridade), estudava Adolfo Coelho «o organismo da língua nos seus elementos – os sons, as formas e o conjunto de processos por que as palavras se unem em orações simples e as orações simples em orações compostas, a sintaxe» (A lingua portugueza: phonologia, etymologia, morphologia e syntaxe, 1868, p. iii). O modelo que segue é o histórico-comparativo de Diez e, de modo mais geral, «os trabalhos que na Alemanha, Inglaterra e França, mas sobretudo na primeira dessas nações, fundaram a glótica, ou ciência da linguagem, trabalhos de que no presente livro se acham expostos alguns resultados e que, pela sua importância, pelas questões de primeiro interesse sobre que lançaram uma luz inesperada, de dia em dia vão chamando mais a atenção do mundo civilizado.» (Idem, p. v) O idealismo juvenil destas palavras casa bem com a novidade da ciência e com os projectos de trabalho que anuncia, e só em parte cumpriria: «Uma história da língua portuguesa, um dicionário etimológico da mesma, um glossário do português arcaico e provincial completarão as nossas investigações no campo da língua que primeiro falámos.» (idem, p. iv) Neste programa, não se deve ler apenas a curiosidade de adquirir conhecimentos e de os facetar com instrumentos modernos. O motor de Adolfo Coelho residia nas suas convicções de transformação social e cultural, enfrentado com um país de analfabetos, com escolas que não faziam distinção entre ensino laico e ensino religioso, com universidades produtoras de oratória e ilusões. Assim, a justificação para o seu livro (e de boleia para a introdução da moderna linguística) encontra-a Adolfo Coelho na urgência de combater o estado de ignorância em que se encontrava a filologia portuguesa do tempo: «Quando começámos a conhecer os trabalhos dos modernos filólogos estrangeiros, vimos tristemente que a filologia portuguesa era completamente alheia aos progressos que a ciência da linguagem, a glótica, para usarmos da melhor das denominações que lhe têm sido dadas, tinha realizado em as nações que outro tempo acompanhámos no seu desenvolvimento intelectual. Portugal está em filologia pouco mais ou menos no ponto em que essas nações estavam no começo deste século.» (Idem, p. vii). Nas páginas seguintes, desdobra em comprovação severa críticas a obras recentes, como o Dicionário de D. José de Lacerda e o Génio da Língua Portuguesa, de Francisco Leoni, pelo caminho castigando as teses celtistas de António Ribeiro dos Santos e do Cardeal Saraiva e ofendendo Inocêncio pelo apreço que este manifestara a Lacerda. Ao concluir a introdução do seu livro, na pág. xix, o jovem Coelho tinha não só deixado claro ao que vinha, mas tinha igualmente feito meia dúzia de inimigos entre sábios mortos e vivos. Pela exigência científica, pela arrogância e pela falta de tacto, estava consagrado como o justo precursor de uma disciplina que, no nosso país, pródiga se tem revelado nessas mesmas virtudes. |
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