Desse processo de trabalho exemplar se fica a conhecer exaustivamente no artigo sobre as crónicas portuguesas quatrocentistas de Marrocos, onde nomes de pessoas e de lugares são averiguados e estes por sua vez confrontados com as designações actuais – muitas das quais de visu conhecia. Robert Ricard quer e consegue fazer uma leitura no terreno e nos textos em combinação, sempre com grande acuidade. Interessado nas fontes e dominando os idiomas português e espanhol na perfeição, traduziu muitos excertos de crónicas e outros textos, com exemplar fidelidade aos originais: de Gomes Eanes de Zurara, do infante D. Pedro, de frei João Álvares, de Duarte Pacheco Pereira, de Damião de Góis, de Diogo do Couto, de Francisco de Andrade, de frei Luís de Sousa e de muitos outros.

Poucas coisas lhe terão escapado, desde que a sua atenção despertassem: um outro exemplo consiste nos significados das formas de montar a cavalo, com as diferentes designações – à gineta ou à brida – não pelo pormenor em si mas como esclarecedor das tácticas militares, como o exacto sentido do rebate ou rebato, necessário para se perceber certos aspectos das lutas em Marrocos (Études, pp. 345-355). Que não queria deixar sem sentido em obscuras passagens de crónicas. Notáveis notas dedicou à evacuação das praças portuguesas de Marrocos em tempos de D. João III: Safim e Azamor em 1541 e Alcácer-Ceguer e Arzila em 1549-1550. Sem separar essas retiradas do necessário enquadramento do império português em especial da Ásia – enquadramento sobretudo financeiro que explica a decisão de abandono tomada pelo soberano. Com um sentido muito agudo para tudo o que se refere a aspectos militares. Atenção erudita que não é comum nem seria de esperar em alguém que privilegiava a história cultural e dentro desta os aspectos religiosos – e dentro destes ainda os da espiritualidade. Mas que não queria deixar nada por averiguar. Assim mesmo algumas insignificâncias, desde que com elas se deparasse, havia que averiguar e acertar. É o caso do lugar de enterramento de D. Juan Manuel em que a confusão se estabelecia entre Peñafiel (Castela-a-Velha) e Penafiel (Entre-Douro e Minho). Correcção mínima a escrito de Joaquim de Carvalho que, no entanto, não adiantava nada. E por isso vai só em nota. Mas que não deixa de fazer constar (Études d’Histoire, p. 122).

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