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Ricardo de Almeida Jorge, nascido no Porto, filho de um ferreiro, fez estudos secundários no colégio da Lapa, cursou na Escola Médico-Cirúrgica do Porto (1879), da qual se tornou professor em 5.5.1880. Médico de formação, foi uma personalidade complexa e eclética no meio científico e cultural português, cuja atividade se desenrolou nos domínios da saúde, mas também na literatura, nas ciências sociais e humanas, na história. Não sendo historiador de raiz, Ricardo Jorge deixou-nos contributos no campo historiográfico, pela forma como usou a informação e por trabalhos de clara pesquisa histórica em temáticas sanitárias e domínios como a arte, a literatura ou a população. Egas Moniz apresentava-o como “o grande cronista do Porto do seu tempo e até do passado da cidade”, assinalando que “tinha uma marcada tendência para os estudos de história, em particular os ligados à nossa ciência” (Lisboa Médica, n.º 9, 1939), mas a sua contribuição é mais abrangente. O reconhecimento do papel da história no campo científico surge logo com a dissertação inaugural apresentada na Escola Médico-Cirúrgica do Porto – O Nervosismo (1879). Questionando-se sobre a conveniência da “história da questão” face ao “positivismo severo” que imperava, Ricardo Jorge argumentava que “à medicina hodierna, apesar de locupletada com as descobertas que à flux lhe trouxeram a observação direta e a experimentação, compete-lhe ouvir atenta as lições da história para tomar no devido valor os monumentos que prostrou por terra, agremiar os que deixou de pé e sujeitar aos superiores meios de critério que adquiriu a sua evolução progressiva, para furtar-se ou à convivência com os erros pretéritos ou ao plagiato das descobertas do passado” (Um ensaio sobre o Nervosismo, 1879, p. 2). Evolucionista, partia, naturalmente, das novas crenças do seu tempo, vendo a história como “determinadora única e irrefragável das leis do progresso e do encadeamento dos sistemas, princípio inconcusso, que não é mais do que uma das multíplices faces do evolucionismo que hoje preside a todas as nossas arquitetações científicas”. A dissertação comporta, então, um historial das abordagens ao “nervosismo”. Seguiu-se outro texto na mesma linha, “As localizações motrizes no cérebro” (1880), para concurso à Escola Médico-Cirúrgica do Porto, tornando-se docente nas vésperas de completar 22 anos. Eram, contudo, textos sobre ligações psiquiátricas e nevropatológicas inspiradas nos contributos inovadores de Charcot, no Hospital de Salpêtrière, em Paris, que usava o método experimental e anátomo-clínico. A aposta de Ricardo Jorge na neurologia indiciava um desejo de ingressar no Hospital de Alienados Conde de Ferreira (dotado em testamento de 1866, inaugurado em 24.3.1883), instituição inovadora em Portugal. Desafio que terá sido comum a dois estudantes da altura, Ricardo Jorge e Júlio de Matos, amigos e companheiros desde a infância. Terá sido esse desígnio que levou Ricardo Jorge, em Janeiro de 1883, a Paris e a Estrasburgo. O lugar de diretor do Hospital já tinha sido atribuído, em 1881, ao lente de Coimbra, António Maria de Sena, mas faltava completar a equipa. Sena preferiu Júlio de Matos para adjunto, talvez por razões de exclusividade. Ricardo Jorge, no seu retorno, ainda manteve algum entusiasmo “neurológico”, criando um gabinete de histologia, enquanto lente substituto da secção cirúrgica, onde tirocinou Magalhães Lemos para elaboração da sua dissertação (A Região Psicomotriz), ingressando depois nesse Hospital. Mais tarde, Eduardo Coelho corroborou uma confidência de Ricardo Jorge, afirmando: “atirara-se com entusiasmo à neurologia, chegara a pensar em dirigir o Manicómio do Conde de Ferreira”, para depois se tornar higienista e epidemiologista, entregando-se ao “culto do credo pasteuriano” (Coelho, “Ricardo Jorge Mestre…”, 1946, pp. 247-251). |
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