Joel Serrão vai comungar estas ideias, como se pode verificar pelas suas primeiras publicações. Acasos da vida, aliado a um interesse por Fernando Pessoa, leva a que publique em 1945 as cartas que este poeta endereçou a Armando Côrtes-Rodrigues, que JS conhecera nos Açores. Logo no prefácio, recupera algumas das ideias já patentes no Horizonte, nomeadamente a necessidade de implementar uma atitude científica no meio intelectual português, que inclui a análise que se fazia do autor da Mensagem, até aí demasiado apologética (Cartas de Fernando Pessoa a Armando Côrtes-Rodrigues, 1985, 10).

Podemos considerar como um marco distintivo do seu percurso historiográfico este caminho que inicia com Fernando Pessoa – poeta que continuará a estudar –, passando por um conjunto alargado de intelectuais. Desejava compreender distintas personalidades do pensamento contemporâneo português na sua complexa interligação com o meio social, cultural, técnico e mental em que viveram. O homem no seu meio, claro, mas também uma peculiar sensibilidade ao perfil psicológico desses vultos, que lhes conferia um cunho específico no entendimento que faziam do seu tempo e capacidade de dimensionarem esse próprio meio (A emigração portuguesa – sondagem histórica, 1977, 219). Joel Serrão seguia assim na esteira dos avanços da nova historiografia francesa quanto aos estudos biográficos, dos quais Lucien Febvre é exemplo. É, aliás, deste historiador que vai buscar um dos seus conceitos predilectos – utensilagem mental (outillage mental) – o que é só por si bem significativo desta filiação. Conceitos como conjuntura e estrutura são igualmente frequentes nas suas obras e, como objecto de estudo, irá dedicar especial atenção aos conceitos de revolução, classe, povo, burguesia, sebastianismo, etc. Para além de Pessoa, e só para dar alguns exemplos, Antero de Quental, Sampaio Bruno, Manuel Laranjeira ou Cesário Verde foram alvo de atenção por parte do historiador madeirense.

Em última análise, esta intenção de entender as correlações do homem com o seu meio, numa perspectiva da sociologia da literatura, estrutural no seu percurso historiográfico, reside na crença que tinha no valor absoluto do ser humano enquanto definidor do tempo em que vive e virá a viver; uma luta constante pela compreensão e domínio das forças condicionantes, embora não absolutas e mecanicistas, da vida em sociedade. Só conhecendo as nossas dependências poderemos ambicionar à consciência e domínio das nossas liberdades (Emigração portuguesa – sondagem histórica, 13; Temas de cultura portuguesa, 1960, 19).

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