Sociedade Portuguesa de História da Civilização 1947-1953?
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Numa carta enviada a Magalhães Godinho em Março de 1946, Fernand Braudel sugeria a criação de um Centre d’Études et de Documentation Portugaises para suprir o desconhecimento que em França existia sobre a história portuguesa (Magalhães Godinho, Do ofício e da cidadania…, pp. 115-116). Não surpreende por isso que na carta de princípios que Magalhães Godinho enviou de Paris para os sócios fundadores da SPHC, em Fevereiro de 1947, estejam já definidos os objectivos de enviar todas as informações históricas sobre a realidade portuguesa que lhes fossem solicitadas, a identificação de erros relativos à história de Portugal que se encontrassem em obras francesas e um relatório sobre a investigação e o ensino das ciências humanas em Portugal.
Por sua vez, a SPHC tinha também o objectivo de estabelecer relações com investigadores estrangeiros, mais precisamente do Brasil. Em Abril de 1948, Borges de Macedo informava que a comissão organizadora da SPHC tinha já solicitado a colaboração de investigadores brasileiros ou a trabalhar no Brasil, casos de Pedro Calmon, Gilberto Freire, Simões de Paula, Olga Pantaleão e Donald Pierson. Para além de França, as relações com os investigadores brasileiros são claramente privilegiadas. Nos estatutos enviados ao Governo Civil, indicava-se que se podiam constituir núcleos da SPHC em qualquer território português e brasileiro (art. 2º) e que os sócios ordinários só seriam dessas nacionalidades (art. 7º). Este enfoque nas relações com o Brasil parece indiciar que nesse desígnio expansionista das instituições correlacionadas com os Annales, Portugal – até pela atenção que era dada às temáticas da expansão ultramarina e ao desabrochar do capitalismo comercial a uma escala global – funcionaria como uma plataforma de ligação ao país sul-americano.
Ainda assim, há que lembrar que as relações académicas entre o Brasil e a França tinham já sido reforçadas nos anos 30 aquando da criação da Universidade de São Paulo, que nessa fase inicial contou com a colaboração de uma missão francesa onde estava Fernand Braudel, aí leccionando entre 1935 e 1937. Quase duas décadas depois, em 1954, uma nova missão francesa deslocou-se a São Paulo, desta vez com a presença de Magalhães Godinho (Ferlini, “Affluences, croisements…, 2005), o que atesta a existência de importantes relações académicas e afinidades historiográficas entre investigadores desses países – o percurso académico de Joaquim Barradas de Carvalho talvez seja o melhor exemplo dessas ligações (Mota, “Joaquim Barradas de Carvalho, 1994).