O facto de só a partir do reinado de D. Dinis, ou mais seguramente de D. Fernando, se ter fixado em Lisboa o arquivo da Coroa não significa que anteriormente não houvesse produção de documentos régios e mesmo um arquivo, embora ambulante, acompanhando a Corte nas suas deslocações pelo País. Na verdade, temos confirmada a existência de uma chancelaria condal no tempo de D. Henrique e D. Teresa (de 1095 a 1128) e com o rei D. Afonso Henriques teve início a atividade da chancelaria régia, datando de 27 de abril de 1128 o primeiro ato do infante Afonso Henriques – a confirmação da carta de privilégio à cidade de Guimarães (A. J. Costa, “La Chancellerie royale…”, 1975, p. 147).
A inexistência de um arquivo fixo, devida ao facto de a própria corte não ter ainda uma residência estável, levava a que dos mais importantes diplomas emitidos pela chancelaria régia se fizessem vários exemplares, que ficavam depositados nos cartórios dos mais influentes mosteiros (Mosteiro de S. Vicente de Fora, Convento da Costa em Guimarães, Convento de Santa Cruz de Coimbra e Mosteiro de Alcobaça), até porque, em vários casos, eles eram aí redigidos pela mão de escribas monásticos (J. P. Ribeiro, Memorias authenticas…, 1819, pp. 5-8 e 11-12; J. P. Costa, “O Arquivo Nacional...”, 1994, pp. 97-98; J. Pessanha, “A Torre do...”, 1906, p. 458; P. Azevedo e A. Baião, O Arquivo da Torre..., 1989 [orig. 1905], p. 13).
A chancelaria régia evoluiu rapidamente no sentido de uma boa organização, sinal de uma atividade regular. Menos de um século após a fundação da nacionalidade, no reinado de D. Afonso II, surge o primeiro livro de registo da chancelaria, que vai abranger os anos de 1217-1221 (R. Azevedo, “O Livro de registo…”, 1967), sendo dos mais antigos das chancelarias reais europeias. O registo dos documentos expedidos pela chancelaria régia pode-se considerar o primeiro instrumento de acesso à informação do Arquivo da Coroa, permitindo a pesquisa retrospetiva, no sentido de localizar e identificar os documentos expedidos pelo serviço administrativo régio. Assim, a própria chancelaria, produtora dos atos documentais, servia simultaneamente de arquivo, o que se comprova pelo facto de emitir certidões dos documentos que conservava (J. P. Ribeiro, Memorias authenticas…, 1819, p. 12).
A chancelaria régia sofreu uma evolução no sentido de uma cada vez mais intensa e regular atividade, patente na quantidade e diversidade de documentos expedidos e respetivo registo. A partir do momento em que o Arquivo da Coroa se estabeleceu na Torre do Tombo – assim designada por aí se conservarem as escrituras do “tombo”, termo que se referia ao chamado livro de Recabedo Regni, ou seja, o das receitas da Coroa – os livros de registo da chancelaria passaram a dar entrada no arquivo logo que deixavam de ter uso administrativo corrente, o que normalmente sucedia alguns anos após a morte dos monarcas (P. Azevedo, “Os Livros da chancelaria…”, 1906).