O provimento progressivo de pessoal qualificado no Arquivo da Coroa permitiu um incremento do trabalho arquivístico, no que toca à organização do acervo e à criação de instrumentos de acesso à informação, designadamente a elaboração de reportórios, índices e inventários. Ao período de abandono a que esteve sujeito durante a dominação filipina, sucedeu uma nova era de cuidado e preocupação que se traduziu numa autêntica reforma do arquivo, tanto pela mão de Jorge da Cunha, como de Manuel Jácome Bravo, nomeado guarda-mor em 1632. A importância que lhe foi novamente atribuída traduziu-se, por exemplo, na promulgação de diplomas com determinações relativas à acessibilidade e à incorporação de documentos, tanto no reinado de D. João IV (Idem, pp. 37-38), como no de D. Pedro II, mas foi com a nomeação do engenheiro Manuel da Maia, para guarda-mor, em 12 de fevereiro de 1745, que se aprofundou a reforma começada no século XVII (A. Baião, “Manuel da Maia…”, 1942). Infelizmente, o trabalho, que paulatinamente se ia consolidando, sofreu um rude golpe com o terramoto de 1755, o qual acarretou a mudança do arquivo para o Mosteiro de São Bento e implicou um esforço de reconstituição do acervo documental e de reorganização do serviço.
Em pleno Século das Luzes, as conceções iluministas tiveram influência nos critérios adotados para a reestruturação do arquivo. A primitiva ordem dos documentos e das séries arquivísticas perdeu-se com o desmoronamento da “Torre do Tombo” e no meio dos escombros a documentação ficou numa enorme confusão. Infelizmente, a reconstituição dos fundos não procurou recuperar a ordem original, antes se pautou por métodos “em moda” na época, ou seja, as classificações metódicas, de base intelectual e não orgânica. Assim nasceram “coleções artificiais” de documentos, ordenadas cronologicamente, segundo uma perspetiva que não privilegiava a proveniência da documentação. O Corpo Cronológico, coleção constituída por 525 maços que reúnem 82.902 documentos, originalmente pertencentes ao funcionário régio Pêro de Alcáçova Carneiro, é um exemplo paradigmático da aplicação de um método de ordenação baseado numa lógica que não respeitava a natural ordem de produção. A coleção intitulada Bullarium ou as Cartas Missivas são outros exemplos de reconstituições em que foram agrupados vários tipos de documentos como ordens régias, petições, mandados, notas avulsas, etc., sem atender à lógica da sua proveniência.
A primeira metade do século XVIII caracterizara-se por um grande incremento na produção de instrumentos de acesso à informação. O período entre 1713 e 1742, correspondente ao desempenho do guarda-mor João Couceiro de Abreu e Castro, foi muito proveitoso especialmente quanto à elaboração de índices das várias chancelarias régias. Aliás, com a criação da Academia Real da História Portuguesa, aumentou muito a consulta dos documentos, pela necessidade de se copiarem os que eram de interesse para os académicos, o que foi determinante para incentivar a produção de índices e inventários. Mas a elaboração de um instrumento de pesquisa global, que permitisse controlar e identificar o acervo do arquivo, só veio a concretizar-se em 1776, no tempo do guarda-mor João Pereira Ramos de Azeredo Coutinho, com o Inventário dos livros, maços e documentos que se guardam no Real Archivo da Torre do Tombo. Nesta altura tinha já o Arquivo da Casa da Coroa 26 armários, para além dos 15 de livros de chancelaria e 3 de índices, o que denota não só o aumento do acervo mas também uma organização em novos moldes, após o terramoto. Em finais de Setecentos, José Pedro Miranda Rebelo, amanuense da Torre do Tombo, produziu um relatório, intitulado Extracto do Real Archivo da Torre do Tombo (Rebelo, 1904 [post 1776]) em que descreve a situação do arquivo, dando uma perspetiva da sua evolução ao longo do tempo. Particularmente significativo é o facto de apontar a inexistência de um regimento, como causa de “infinitos abusos” e razão para tudo ser deixado ao livre arbítrio dos guarda-mores (Rebelo, Idem, pp. 35-36). Com efeito, o primeiro regulamento do Arquivo da Coroa apenas se concretizou em 1802, num documento intitulado Ordens que se devem observar neste Real Archivo daqui em diante.