Em síntese, olhando para estas três fases em toda a sua extensão, dos jovens cuja aproximação ao marxismo se deu no quadro da II Guerra Mundial aos que o tornaram seu já depois do Maio de 68, três linhas de continuidade merecem desde logo ser sublinhadas. Em primeiro lugar, o principal da actividade historiográfica marxista desenvolveu-se à margem da universidade portuguesa, de que os historiadores marxistas estiveram quase sempre excluídos até ao 25 de Abril de 1974. Alguns trabalharam em universidades estrangeiras, em França, na Checoslováquia ou no Brasil, e dividiram o tempo dedicado à investigação com o que lhes era requerido por afazeres profissionais necessários à sua subsistência – no campo da tradução, do jornalismo ou da publicidade, mas também em ofícios sem função intelectual. Em segundo lugar, todos estes historiadores foram não só cientistas sociais que intervieram no campo historiográfico, mas também intelectuais que se fizeram ouvir no terreno político. A par do trabalho historiográfico, procuraram fazer a denúncia do regime então vigente em Portugal e do capitalismo enquanto sistema mundial, concedendo maior prioridade ora à crítica deste ora à crítica daquele e fazendo ainda a condenação do colonialismo português. Em terceiro lugar, foram os temas do político, do social e do económico que predominaram na investigação realizada ao longo das três fases estudadas, mesmo se é certo que uma das obras portuguesas de inspiração marxista com maior repercussão se situou no domínio da cultura (Saraiva e Lopes, História da Literatura Portuguesa, 1954).
Eixos Problemáticos da História Marxista
Tendo em conta o que distingue a historiografia marxista de outras tradições historiográficas, mas também a diversidade interna a toda e qualquer tradição historiográfica, organizaremos a nossa escrita sobre o curso da historiografia marxista em Portugal em torno de três eixos problemáticos: (1) a circunscrição nacional do espaço histórico (sob o lema da independência nacional e do patriotismo) e a inserção da história nacional numa dinâmica internacional (sob o lema do anti-imperialismo e do internacionalismo); (2) o apuramento de factores determinantes do processo histórico, numa busca pela causalidade que desembocou no apuramento de razões que seriam próprias, por um lado, à estrutura económico-social e, por outro, à acção política; (3) e, finalmente, a configuração desta acção política, a este respeito desenvolvendo-se tendências interpretativas de cariz mais vanguardista ou mais igualitário.