Numa “casita humilde com porta e janelas para a Travessa do Mato” (OC, 1992, p. 483) nasce na cidade que cresce para a faina fluvial e marítima. O pai, Manuel José de Carvalho, ferroviário, filho de boticários de Cem Soldos (Tomar), depois estabelecido negociante de vinhos, é “muito inteligente, sensato e prudente, e apesar de ter poucos estudos, muito interessado em assuntos culturais, sobretudo história e literatura” (Miscelânea,1963, p.899). A mãe, a guarda-linha Ana Ferreira dos Santos, também provém de raízes marranas dos Campos do Mondego.

Lendo primeiras letras com a tia, mestre-escola e piedosa católica, cresce no meio liberal e republicano e ingressa no Colégio Liceu Figueirense, talhado à burguesia endinheirada, recém-criado por um apóstolo da escola nova, dos espaços-abertos de Fröbel e do self-government, Mendes Pinheiro (Sílvio Lima, um místico da razão crítica (da incondicionalidade do amor intellectualis), 2009).

Em Coimbra, útil e longo encontro com Unamuno o marca, tendo meteórico giro: formado em Direito (1914) cursa a primeira licenciatura em Filosofia na nova Faculdade, cuja excepcional classificação (1915) avaliza o doutoramento (1917). Em 1916, Alves dos Santos (pioneiro na Psicologia Experimental) e Mendes dos Remédios, historiador dos Judeus que delata a “história da intolerância” pátria (Biblos, I, 1925), patrocinam-lhe a docência, incumbido de Moral, História da Filosofia Antiga e H. da F. Moderna.

Crente na virtù, valor maior na cidadania das letras, firme republicano antes e após a revolução ganhar a rua, estudioso da formação da ideologia republicana no séc. XIX, o esteio filosófico essencial oscila entre Rousseau e Kant. Em 1919, avalia a dupla atracção: “Uma impulsiva, que me arrastou ao mais ardente jacobinismo; outra contemplativa, pela qual me isolava no meu quarto trabalhando delirantemente” (A minha resposta). Na vis meditativa, no estudo que o Idealismo propicia e na Kulturkampf, supera decisivamente o jacobinismo, sem quebra do protesto cívico contra o Reino da Estupidez, assim designado por A. Sérgio (V.) ao reler um velho texto de 1818, (re)instalado após 1926.

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