1. Não é possível sintetizar – sequer inventariar – a extensa, multímoda, obra de JC, historiador da cultura, no modo como consolidou e alargou o estudo da história das ideias filosóficas, científicas, literárias, religiosas e políticas.

No inicial meio século das Faculdades de Letras no país, criadas pela República (1911), é figura central do ensino e da investigação historiográfica da Filosofia em conexão com as fontes da história das ideias, só sendo possível cotejar, no plano lógico-filosófico, ensaístico ou psicológico, Vieira de Almeida, Edmundo Curvelo, Sílvio Lima ou Delfim Santos, que não escavam similar via metódica. Melhor, ele “agiganta-se no campo da produção universitária” do séc. XX, ao propor-se achar “a linguagem histórica que falamos” e mostrar “traços ainda ocultos da história cultural portuguesa” (Biblos, 1980, pp.7-8).

Embora ideológica e politicamente nos antípodas, mas irmanado (com Paulo Merêa) na refutação da cultura universitária coimbrã de teor positivista, Cabral de Moncada, amigo e admirador, nele vê “o maior historiador da cultura portuguesa na sua expressão histórico-filosófica e filosófico-literária deste século” (Para a História da Filosofia em Portugal no século XX, 1960, p.9). Um analista atento à coeva produção ibérica, achava na polígrafa inquirição da cultura portuguesa promovida por JC, apenas paralelo, no contexto castelhano, no oitocentista Menéndez y Pelayo (Miscelânea, 1960, p.346). Embora o casticismo de Pelayo não se inscreva na generosa genealogia cosmopolita e liberal de JC, na analogia se confirma o incansável investigador.

Figuração do clerc universitário em repulsa à autocracia do Estado Novo, não dobra aos ditames de Salazar por mais que este, passo a passo, lhe vá roubando muito: a direcção da Biblioteca Geral (que junta ao secretariado de O Instituto de Coimbra) e a edição da Revista da Universidade; a administração e direcção da Imprensa da Universidade, extinta em 29-VIII-1934, onde criou notáveis colecções, quer de edições críticas de fontes – mormente nos corpos Scriptores rerum lusitanorum, incluídas as Crónicas; Biblioteca dos escritores portugueses; Subsídios para a história da arte portuguesa; Documentos para a história da expansão ultramarina dos Portugueses; Biblioteca do século XVIII; Biblioteca luso-brasileira de história da Medicina; ainda Arquivo de História e Bibliografia (1923-1936), editado postumamente em 1976 –, quer, em sentido mais vasto, especializando a divulgação dos clássicos da filosofia política e, em geral, da literatura ético-filosófica (Biblioteca Democrática; Filósofos e Moralistas e Vária), editando Kant, Montaigne, Descartes, Leibniz, Renouvier, Meumann, Croce e outros. Mas, ao mesmo tempo, abria páginas a ensaios de novos autores portugueses (Cruz Malpique, Agostinho da Silva, Saavedra Machado, Newton de Macedo, Adolfo Casais Monteiro ou João Ameal, aqui contestado por sectores do reviralho).

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