Jaime Cortesão retratou-se em 1960 como um “poeta de acção, pronto sempre a exaltar o homem heróico e a transformar, por esse modelo, a ideia em acto.” (“Prefácio a modo de memórias”, in O Infante de Sagres, n/n). Poeta, antes de mais. E político, desde cedo.

Em 1910, já médico formado pela Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa (depois de ter frequentado Direito em Coimbra e Medicina no Porto), propõe-se para deputado pelo Partido Republicano Português. O que não conseguirá: a Constituinte de 1911 não ouvirá o seu verbo ardente de republicano radical – com raízes anarquistas e filiação maçónica. Apenas fugazmente exerce a clínica, publica versos e encontra um medíocre lugar de professor provisório de História e Literatura no Liceu Rodrigues de Freitas, no Porto, enquanto se lança à conquista do meio literário de mistura com a acção cívica. É a ‘Renascença Portuguesa’, é A Águia (2ª série, com Álvaro Pinto, Teixeira de Pascoaes e Leonardo Coimbra, entre outros) e a Universidade Popular ligada a esse movimento intelectual.

A história? Lecciona-a e divulga-a. História a que se reservava um papel fundamental na ideologia republicana. A República sonhada heróica precisa de história para se autolegitimar. A liquidação de uma dinastia secular tem de fazer prova de que esta corrompera e abastardara a nacionalidade, destruindo o velho e heróico Portugal. É nesta retórica que enfileira Jaime Cortesão, pondo ao seu serviço o talento literário de que dispõe: na poesia e na tribuna, e mesmo nos contos que publica. Romantismo político e exaltação também romântica na literatura. A condizer. A invocação do passado, que está no âmago do momento esfusiante, é privilegiada nas manifestações literárias. Abordando o problema da história na almejada renascença portuguesa pelo seu lado pedagógico – na instrução primária, secundária e de divulgação popular (vitalizar e impulsionar o Povo ao heroísmo) – critica os métodos, programas e compêndios em uso. Sublinha a importância do esforço dos humildes nos grandes empreendimentos pátrios – as Descobertas – e o proveito a tirar da apresentação “viva e artística” das biografias dos heróis. Ao Portugal dos grandes momentos, por isso mesmo euforizante, há que contrapor, para contraste repulsivo, a narrativa do período de decadência: era a necessidade de tornar unânime a República para o esforço renovador, condenando as tiranias. História de Portugal vista a preto e branco. Aos descobrimentos segue-se a destruição das vontades e esvai-se o impulso colectivo por obra do jesuitismo. Que havia que combater.

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