De igual forma, os constantes recuos ficcionais que Camilo faz a épocas anteriores acontecem para que o leitor tenha consciência de como não é possível falar do presente, e muito menos entendê-lo, sem ter em conta o peso que as raízes históricas cristalizam na noção de família. Em Camilo Castelo Branco, o universo familiar é, assim, a primeira e talvez mais clara fundação do social, um espaço supostamente privado onde os poderes públicos se exprimem e as descoincidências de objectivos e reivindicações se erguem. Para compreender os indivíduos do presente, pois, é preciso que a história deles (que é a sua mas também a da sua família) se manifeste. Para compreender o presente, é preciso que as raízes históricas que tem se revelem, para lá de qualquer dúvida. E por isso os mistérios que ensombram o passado são objecto de uma escavação histórica (em metáfora de Walter Benjamin) que une inextricavelmente o que se passou ao que se passa. A batalha de Alcácer-Quibir e as suas consequências individuais; as Invasões Francesas; a guerra civil entre absolutistas e liberais; a Inquisição e a perseguição aos judeus; são alguns dos temas históricos para a narrativa camiliana. Mas, mesmo nos romances (ou nas novelas) não directamente designados como “históricos” (a maior parte), Camilo revela uma consciência aguda da condição histórica do indivíduo, em termos quer de herança temporal quer de atmosfera social. Se a “narrativa de feição histórica”, na sua feição romântica, é aparentemente “passadista”, propondo um olhar retroactivo para uma época que não é a coeva, importa não esquecer que esse passado estabelece com o presente, aos olhos dos seus maiores, uma relação dinâmica, possibilitando pois uma acção mental e até factual sobre esse mesmo presente.