Vai todavia prosseguir a actividade de investigador sob o patrocínio de Fernand Braudel, a quem o unia uma recíproca estima, na École Pratique des Hautes Études (E. P. H. E - 5e section), o embrião da futura École des Hautes Études en Science Sociales (E. H. S. S.). Actividade por sua vez interrompida, em 1969, quando presumivelmente o braço longo de Israel S. Révah, o antagonista que já obtivera o seu afastamento do C. N. R. S., levou com sucesso a intriga até àquela escola. Momento em que uma vez mais enfrenta uma situação crítica, colocando-se-lhe finalmente a hipótese de aceitar o convite da Universidade de Brasília, entre outras possibilidades de ensino longe da Europa. Todavia um concurso internacional de que sai vencedor permite-lhe, após décadas de afastamento, regressar, por fim, ao ensino e ocupar o lugar de director do Departamento de Estudos Portugueses da Universidade de Amesterdão (1971-1974).

Em França, que passou a visitar com regularidade, e sem deixar de manter uma activa colaboração em jornais e revistas portuguesas, havia-se concentrado no estudo da obra de António Vieira e do Barroco. Os resultados ia-os então divulgando em diferentes publicações, anos mais tarde compilados para uma edição brasileira intitulada O discurso engenhoso (1980). Como foi colocando, ao longo desses inspirados anos 60, ensaios de tema predominantemente crítico-literário em reputadas revistas parisienses (Temps Modernes, Annales E S.C, Poétique). E preparara outros escritos, entre os quais, a reedição reformulada do livro de 1953 sobre o Tribunal do Santo Ofício, agora dado à estampa sob o título Inquisição e Cristãos novos (1969), e o seu mais imediato e estrondoso êxito editorial. Porém, e surpreendentemente, exceptuando uma tímida e curta abertura à analítica freudiana, sem rever a perspectiva economicista que, no texto antecedente, orientara a análise dos mecanismos e objectivos da instituição. Uma sobrevivência, por conseguinte, do velho paradigma marxista do qual já se tinha arredado em outras análises e teorizações ao longo da mesma década. Versão que reactivou a antiga e mortífera querela com aquele seu implacável opositor intelectual. O relançamento da contenda desenrolou-se em 1971 (Maio - Junho), quando Saraiva, como foi referido, havia já trocado Paris por Amesterdão. Em réplicas sucessivas e em tom virulento, o debate, sempre em crescendo, entusiasmou vivamente os leitores do Diário de Lisboa. Qualquer que hoje seja a opinião acerca da problemática em causa, no essencial, a distinção epistémica entre documento autêntico e documento verídico, a hegemonia do factor económico e a relevância de outros níveis do processo social, esta obra de Saraiva, analisada weberianamente de um prisma “idealtípico”, não deixa de nos impressionar pelo vigor da argumentação e a plasticidade da escrita. Outra das suas inequívocas obras-primas.

1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 | 7 | 8 | 9 | 10 | 11 | 12 | 13 | 14 | 15 | 16 | (Pdf)