De certa forma, podemos considerar que a dimensão pública da Biblioteca Nacional conseguiu sobrepor-se à vertente de censura das leituras disponibilizadas para um público mais alargado. Recorde-se a existência, nessa época, de outras bibliotecas de natureza semelhante: a British Library (fundada em 1700), a Bibliothèque Nationale de France (declarada propriedade nacional em 1792) ou a Biblioteca Nacional da Hungria (1802).
A nomeação do bibliotecário-mor e de um 2º bibliotecário para esta instituição, apoiados noutros quadros administrativos, deu lugar ao início do ciclo fundacional da Biblioteca, que aspirava a tornar-se na maior Biblioteca Pública do país, um desiderato que não foi alcançado no período de cerca de 20 anos em que António Ribeiro dos Santos esteve à frente da Real Biblioteca, não por falta de iniciativa do seu responsável, mas por contingências próprias da evolução política do país, que se viu apartado do poder central com a saída da família real para o Brasil, na sequência das invasões francesas.
Na constituição do núcleo inicial da primeira Biblioteca Pública portuguesa releva-se, por um lado, a sua radicação em Lisboa, no Terreiro do Paço e, por outro lado, o facto de seguir a organização dos saberes em voga na sociedade científica europeia contemporânea. O sistema de classificação bibliográfica utilizado, ao qual foram introduzidas algumas alterações de nomenclatura pelo decreto de 1836, contemplava uma divisão em 12 secções, associando também à numeração das salas, a saber: História (salas 1ª e 2ª); Belas Letras (sala 3ª); Ciências Naturais e Artes (sala 4ª); Ciências Civis e Políticas (sala 5ª); Ciências Eclesiásticas (salas 6ª a 9ª); Poligrafia (sala 10ª); Manuscritos e Antiguidades (salas 11ª e 12ª).
A consistência do sentido público desta biblioteca foi posta em causa pela organização de uma outra Biblioteca Real, sedeada na Ajuda. Uma concorrência excessiva num período que facilitou a repartição do património bibliográfico, até pelo transporte para o Brasil da Livraria Real, que deu origem à Biblioteca Real (pública) do Rio de Janeiro (1809), constituída por inúmeras obras que não retornaram a Portugal com o regresso de D. João VI.