A revisitação de fontes que se verifica a partir da segunda metade do século XIX caberia não apenas a filólogos mas também a historiadores. Se, por um lado, vem a configurar-se como um exercício ideológico de recuperação da glória passada, por outro é um exercício de reflexão sobre as causas de um projeto de império falhado. Publicam-se catálogos de manuscritos existentes em bibliotecas públicas do reino (por exemplo, Cunha Rivara, Catalogo, 1850-1871), um trabalho arquivístico que voltaria a estar muito em voga entre as décadas de 1940 e 1970; recuperam-se fontes documentais, inéditas ou caídas em esquecimento, por via da reimpressão, edição ou tradução (por exemplo, a edição em 1892 pelo Conde de Ficalho de Colóquios dos Simples e Drogas da Índia, em dois volumes, de Garcia da Orta); estudam-se os episódios em que a história nacional se funde com a do Oriente e as grandes figuras dessa história – as que a escreveram (os cronistas), cantaram (Camões, Fernão Mendes Pinto) ou encenaram de forma alusiva (Gil Vicente) e as que a protagonizaram e talharam no terreno (os heróis da expansão, quer os navegadores portugueses quer os seus patronos régios). Este exercício tanto de preservação como de retificação da memória histórica, quer escrita (fontes documentais) quer também material (através do colecionismo e de exposições, e inclusive da numismática e da epigrafia), é um de redefinição identitária e de simultânea reivindicação da pertença portuguesa ao orientalismo.
Muitas das publicações que constituem o quadro de produção discursiva orientalista foram impressas no âmbito de ciclos comemorativos que moldaram a mitologia nacional finissecular pela exaltação dos heróis da história nacional, como o tricentenário de Camões (1880), que narrou a aventura lusitana no Oriente, o quarto centenário da descoberta do caminho marítimo para a Índia (1898) ou o quinto centenário da tomada de Ceuta e quarto de Afonso de Albuquerque (1915). No ato de recuperação e nomeação de figuras do passado histórico português esconde-se não apenas um gesto de humanização desse passado, mas também a constatação de uma dicotomia que permeia todo o discurso português sobre o Oriente, a do pioneirismo no conhecimento do espaço e no entabulamento de contactos comerciais, linguísticos e culturais que seria incompatível com o atraso dos estudos sobre esse mesmo Oriente em Portugal e a falta de visibilidade do país, nos séculos XIX e XX, nos meios de debate europeu.
O aparato crítico das fontes que se revisitam ou até então inéditas serviu frequentemente como espaço retórico sobre o Outro não cristão e não europeu e também de reescrita da História. Veja-se o caso de Esteves Pereira, em que se deteta uma historiografia que, aliada aos princípios da filologia clássica, faz a apologia da verdade histórica da palavra escrita, ou seja, das fontes.