Outras vozes de orientalistas orientais há a registar fora de Portugal mas visando-o nos seus estudos, algumas trabalhando isoladamente sem conseguirem penetrar na comunidade nacional de debate orientalista, porventura por não publicarem em língua portuguesa, por os seus trabalhos terem circulado preferencialmente entre outras tradições académicas e, talvez sobretudo, por serem críticos da atuação portuguesa quinhentista e seiscentista na Ásia, ao denunciarem o uso de violência na imposição de uma religião exógena. Gerson da Cunha, goês de nascimento mas vivendo entre Bombaim e Inglaterra, será o exemplo mais flagrante, como demonstram os trabalhos de Filipa Lowndes Vicente (por exemplo, “Orientalismos periféricos?”, 2010), escrevendo sempre em Inglês e movendo-se entre a Índia britânica e os meios orientalistas italiano e inglês. Outras há mais recentes igualmente periféricas, como a investigação desenvolvida no âmbito do projeto Textos e Contextos do Orientalismo Português, em curso na Universidade de Lisboa, tem revelado. Umas que se emparelham com Gerson da Cunha, como o seu sucedâneo George Mark Moraes, que nasceu em Salsete mas se estabeleceu em Bombaim; outras que, dado o momento em que escreveram e ainda que publicando profusamente e até na metrópole, têm sido ofuscadas pelo protagonismo de historiadores coetâneos mais alinhados com as vicissitudes do regime político vigente. É a situação de José Maria Braga, originário do eixo geográfico de Macau-Hong Kong e consolidando-se como investigador independente, sem um vínculo formal à academia ou a instituições científicas da metrópole portuguesa.
Filho natural de Hong Kong mas descendente e adotivo de Macau, emigrando no final da década de 1960 para Nova Iorque antes de se estabelecer na Austrália (primeiro Camberra, depois Sidney) e de regressar definitivamente ao território norte-americano (S. Francisco), produziu uma vasta e eclética obra sobre a história da presença portuguesa e da ação missionária na Ásia. Um trabalho, aliás, muito na linha do que Cunha Rivara nas décadas de 50 e 80 do século anterior sedimentara, conquanto este se tenha circunscrito à presença portuguesa na Índia e concentrado a sua pesquisa nos arquivos de Goa. Como assinala Isaú Santos (“José Maria Braga”, 2014), Braga desenvolveu importante trabalho arquivístico sobretudo em Portugal (na Biblioteca da Ajuda, onde inventariou as fontes manuscritas existentes do Padroado Português do Oriente, em particular sobre Macau, China e Japão), bem como em Itália e no Japão. Assumindo Macau como o seu principal estudo de caso, juntou-se a nomes como os do historiador britânico Charles Boxer, do macaense Pe. Manuel Teixeira ou do Pe. António da Silva Rego, com quem se correspondia. Quanto ao primeiro, esclarece Santos que os trabalhos de ambos se complementam no “estudo das relações luso-chinesas – desde o dealbar da missionação jesuíta na Ásia – e ainda no [...] conhecimento da posição do eixo Macau/Hong Kong no circuito de informação e contrainformação ocorrido na Segunda Guerra Mundial” (Idem, p. 299). Com efeito, pela sua posição geográfica, Braga serviu como elo privilegiado de ligação/mediação entre Portugal e a comunidade portuguesa de Hong Kong. Por exemplo, por ocasião do primeiro congresso das Comunidades Portuguesas do Mundo, que aconteceu em dezembro de 1964, na capital lisboeta, é contactado por Silva Rego, em nome da Sociedade de Geografia, para que recomendasse representantes da comunidade portuguesa de Hong Kong que ali pudessem participar.