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As críticas que se vão intensificando na imprensa e nos púlpitos de igrejas colocam Herculano diante de um dos mais expressivos focos de guerra cultural que o campo reacionário conseguiu ativar desde a sua desestruturação em 1834 (Saraiva, Herculano e o Liberalismo em Portugal, 161). Reciprocando as provocações, ele escreve então, em 1850, Eu e o Clero, uma carta pública dirigida ao cardeal-patriarca de Lisboa. Em seguida publica inúmeras respostas aos seus detratores, muitas das quais foram replicadas e treplicadas, tudo isso resultando numa espiral polêmica de volume considerável (Buescu, O Milagre de Ourique). As discussões filológicas que ensejaram a controvérsia passaram rapidamente ao segundo plano, enquanto Herculano centrava a maior parte dos seus pronunciamentos em temas ligados à política nacional e eclesiástica do presente. É nesse contexto que ele retorna à posição de operador político, agora sob a roupagem de um eminente intelectual público que se bate, relativamente à distância de ministérios e do poder legislativo, por um programa que combina descentralização político-administrativa, agrarismo e fomento à pequena propriedade fundiária. Em 1851, ainda sob o efeito dos conflitos sócio-políticos do fim da década de 40 em Portugal e da onda revolucionária europeia de 1848, Herculano tomou parte na conspiração que pôs fim ao segundo governo de Costa Cabral. Recusou o posto de ministro do Reino que lhe foi oferecido, mas pessoas que lhe eram próximas (Joaquim Filipe de Soure e José Ferreira Pestana) chegaram a compor, embora por muito pouco tempo, o subsequente governo encabeçado pelo marechal Saldanha (Martins, Portugal contemporaneo, II, 294-295). Passaria a discordar fortemente dos rumos tomados pela “Regeneração”, que inicialmente patrocinara, mas que agora lhe pareciam conduzir de volta ao velho centralismo absolutista. Para ele, o impulso reacionário ficava então disfarçado num discurso apenas nominalmente liberal; era encoberto por um frenesi de obras públicas e melhoramentos materiais, regado às ampliadas ofertas de crédito do mercado internacional de capitais. Herculano reposiciona-se (e é reposicionado) à esquerda do espectro político, aproximando-se dos remanescentes do setembrismo, em aliança com os quais cartistas dissidentes como ele sustêm o chamado Partido Histórico. A despeito disso, não deixará de se opor aos ideais democráticos e ao sufrágio universal, dentro das linhas que traçara já em A voz do profeta (Carvalho, As ideias políticas e sociais de Herculano, 21-40) Continua a polemizar especialmente contra o “absolutismo liberal” agora na imprensa política, escrevendo textos de opinião para periódicos como O Paiz e o O Português, a cuja fundação o seu nome esteve ligado. Em 1854, após ganhar as eleições como candidato antigovernista, assume a presidência da então recém-criada (e, pelo final do século, extinta) câmara de Belém, o que lhe dá ocasião para tentar colocar em prática as premissas municipalistas tão centrais aos seus posicionamentos políticos e às suas interpretações históricas. Renunciaria ao cargo em outubro de 1855, após um dos vários embates micropolíticos que pela época travou com o ministro do Reino Rodrigo da Fonseca Magalhães (Ledesma, “Las plumas”, 191-193; Saraiva, Herculano e o Liberalismo, 19-25; 213-231; 264-266). |
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