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A História de Portugal foi precedida de uma publicação mais episódica em que Herculano delineou os fios-condutores da sua interpretação da história política e social portuguesa: as Cartas sobre a História de Portugal, publicadas ao longo de 1842, na Revista Universal Lisbonense. O traço mais elementar de tal interpretação consiste numa classificação da história portuguesa em dois grandes ciclos, o primeiro dos quais vai desde a formação do Reino até o século XVI, quando principia o segundo. No geral, Herculano avalia positivamente o primeiro ciclo, e especialmente o que supõe ter sido o caráter descentrado da distribuição do poder político medieval, com as prerrogativas reais equilibradas pela presumida força local dos concelhos. Em boa medida relacionada com tal especificidade está a sua tese, introduzida já neste texto e sustentada até os seus últimos escritos, da inexistência do feudalismo em Portugal. O segundo ciclo, por outro lado, é julgado por ele muito negativamente. Desagradava-lhe em especial a centralização de poderes nas mãos do monarca, donde via brotar processos que para ele sinalizavam para a degeneração política e cultural, como o avanço da Inquisição e do colonialismo. Chega a sugerir que de pouca valia seria o estudo do Portugal pós-medieval dos séculos XVI a XVIII, período que pouco se prestava à extração historiográfica de “sabedoria social”, e que talvez devesse mesmo ser esquecido em vez de lembrado (“Cartas sobre a história de Portugal”, 162-163). Do ponto de vista metodológico, é de referir que, no mesmo texto, Herculano já externa críticas a uma compreensão excessivamente factualista da história nacional. Inspirando-se fortemente em argumentos avançados por Augustin Thierry, aponta para a necessidade de histórias que fossem além da narração de eventos políticos e da biografia de figuras eminentes, e que abrangessem no seu escopo interpretativo instituições e outros fenômenos de caráter social (“Cartas sobre a história de Portugal”, 138-142). Ainda assim, já desde as Cartas Herculano dedica uma grande parcela de atenção a personalidades individuais e acontecimentos singulares. A abordagem destes, no entanto, será marcada pela valorização de fontes primárias e pelo crescente recurso a diferentes técnicas de crítica e interpretação documental, o que não raro o coloca em rota de colisão com interpretações tradicionalistas e mitificantes do passado português (Matos, Consciência história e nacionalismo, 18-20). |
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