Faculdade de Letras da Universidade do Coimbra (1911-1974)
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T. Soares, no prefácio à edição multiplicadora dos volumes iniciais de História da Administração Pública, de G. Barros (1833-1925), havia já escrito que, para além do método científico e da «fria análise dos factos e de serena e objectiva construção histórica», o autor revela «sempre o fio condutor que o dirige e anima, [o qual] reflecte a 'pessoa' que dele se serve para a síntese que ambicionava» (tomo I, 1945,p. XI). A História é, também, autobiografia e, por isso mesmo, história contemporânea. Mas esta dimensão não fazia ainda parte do objectivo dos historiadores universitários, para além de ocasiões esporádicas ou do horizonte de alguns programas das provas de doutoramento, assim como, de modo efectivo, no Curso de Férias.
O pulsar da vida pode exprimir-se de muitos modos, mas a história viva pode ser amordaçada pela linguagem que a exprime. A História, com efeito, ao tornar-se ciência eliminou da sua narrativa «all literary ornments and of statements without proof», como se exprimia em 1918 Frederick J. Teggart (Theory, 1960, p. 12). Vasconcelos assim procedeu, embora não tivesse ficado espartilhado pela «passividade e neutralidade rankiana» (Carreras Ares). É verdade que o catedrático de Teologia foi criticado em 1894, a propósito do aparecimento da sua primeira tentativa histórica (Evolução do culto de D. Isabel de Aragão), pelo excesso de erudição e falta de ornamento literário pelo ainda apenas licenciado Mendes dos Remédios. Este gostaria que o autor que «investiga, aquilata, interpreta, analysa, disseca», se não tivesse «deixado possuir demais da sua missão de investigador e de crítico. Disse o que queria pelo menor numero de palavras, attendendo pouco ao ornato». Mas o assunto a tratar, na opinião de Mendes dos Remédios, impunha «a harmonia do rigor historico e da fórma artistico-verbal» («D. Isabel de Aragão», O Instituto, 41, 1894, p. 916-917). Proposta que não vingou, conservando A. de Vasconcelos um estilo, no entanto, bastante diferente do de Gonçalves Cerejeira, «castiço e musical» (L. S. de Matos) em tempos de Eugénio de Castro. Ainda em 1996, o presidente da Academia das Ciências de Lisboa dava razão a Vasconcelos, tão conhecedor da língua e da gramática portuguesas, «pela limpidez da escrita e mesmo pela simplicidade do estilo, tão adequado aos estudos históricos» (Brás Garcia Mascarenhas, 1996, p. VII). E já em 1936, Trindade Salgueiro o tinha como «um mestre consumado da língua», para além de o ser também como «historiador, filólogo, exegeta, sociólogo e artista» («Discurso.», inDoutor António de Vasconcelos. Homenagem, Coimbra, 1937, p. 20). Vasconcelos considerou sempre a história retórica como incapaz de se tornar científica.