O ambiente político de ausência de liberdade criado pela ditadura do Estado Novo condicionava estreitamente a escrita da história. Compreende-se pois que Godinho estabelecesse uma distinção entre “historiadores cortesãos e aduladores” e “historiadores cidadãos” (como vimos já formulada por Herculano em 1840) com referência aos cronistas de finais da Idade Média. Em 1940-41, o regime instituira prémios de História do SNI que seriam atribuídos a autores portugueses e que o apoiavam politicamente (caso de Alfredo Pimenta ou de João Ameal), enquanto a censura proibia a inovadora Introdução geográfico-sociológica à História de Portugal (1941), de António Sérgio, que se via assim impedido de prosseguir um projecto de largo fôlego. Durante o Estado Novo cerceava-se o estudo da época contemporânea nas Universidades, identificado com política e com jornalismo. Nos anos 40, Magalhães Godinho era impedido de escrever uma tese de doutoramento sobre Oliveira Martins. E só já nos anos 60, na Faculdade de Letras de Coimbra (Silva Dias) e na Faculdade de Letras de Lisboa (Jorge Borges de Macedo), seriam incentivados alguns trabalhos sobre o século XIX. Ao invés do que sucedia em Espanha, estes desenvolviam-se então sobretudo à margem do ensino universitário por iniciativa de autores ligados a círculos da oposição ao regime, marcados pela historiografia dos Annales ou pelo marxismo: Joel Serrão, Armando Castro, Victor de Sá , Augusto da Costa Dias e José Tengarrinha, entre outros.
Bem diverso do de Magalhães Godinho era um outro balanço traçado por Fidelino de Figueiredo, em 1954. Historiador da literatura e ensaísta, então professor na Universidade de São Paulo, autor de estudos de literatura portuguesa alternativos aos de Teófilo Braga (estes haviam sido marcados por um positivismo heterodoxo), Fidelino valorizava a função formadora da filosofia na sua relação com a escrita da história. Até certo ponto, distanciava-se da agenda dos combates políticos imediatos, a favor ou contra a República. Mas sublinhava a inevitabilidade da relação entre política e história: “todas as políticas são ou fielmente historicistas ou ambiciosamente anti-históricas” (Historiografia portuguesa do século XX, pp.338-339). Ainda em Portugal, enquanto secretário da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos, afirmara uma intencionalidade tradicionalista na sua actividade. Fidelino conseguira congregar em torno dessa associação e da já referida Revista de História um grupo muito heterogéneo de historiadores numa intenção de renovação do espírito histórico em que convergira erudição, história-ciência e história arte, abertura ao exterior e enraizamento cultural – tendências que se vinham aliás manifestando entre as elites culturais portuguesas.