Desde logo na selecção de temas e protagonistas se reflectia frequentemente essa concepção dominante de uma história sustentada nas suas épocas de ouro e nos homens que as teriam forjado. Quando o Visconde de Lagoa, partilhando com outros pela mesma altura idêntico ensejo de construção de um arquivo biográfico nacional, traçou o seu plano de resgate dos “grandes e humildes” da expansão portuguesa, fê-lo em nome não tanto desses homens quanto da obra que teriam erguido.
Do mesmo modo, foi com o intuito de enriquecimento documental dos “inauferíveis direitos” do país, tal como se plasmou nos seus estatutos, que a investigação no âmbito da refundada Academia Portuguesa de História, muita de tipo biográfico, se lançou. Ela constituiu, de facto, repositório fecundo daquela matéria de que foi feita a versão mais erudita do discurso do poder sobre o passado, tal como ele se havia materializado nas mais distintas figuras da história nacional: do elitismo genealogista do Marquês de São Paio e do conservadorismo monárquico do Conde de Tovar ou de Montalvão Machado, ao eclesiasticismo de António Brásio e D. José de Castro.
Como no terreno da divulgação, também no circuito mais restrito da actividade historiográfica – em que, com propriedade, se incluem academias e institutos –, uma observação mais próxima do objecto não nos revela um decréscimo na produção de biografias que reflectisse, pelo menos quantitativamente, a alteração de qualquer doxa académica. Nem sequer os anos em torno da Revolução de Abril, e muito menos os seus prolegómenos, diminuíram a relevância que a escrita biográfica sempre deteve no conjunto da obra desses autores.
Note-se, desde logo, a inabalável constância que a APH revelou na produção de retratos ou apontamentos biográficos (os Anais, em particular, continuaram a fornecer abundante material biográfico muito para além de ’74), ou mesmo a daqueles que, por vocação, se dedicaram à história religiosa, como Avelino de Jesus da Costa, António Domingues de Sousa Costa, Leite de Faria, António Brásio ou, activos desde a primeira metade do século, Serafim Leite e Domingos Maurício.