Inviável é referenciar as Histórias da Literatura (à justa ressalva da História da Literatura Portuguesa, A. J. Saraiva / Ó. Lopes, resistente ante a usura) e versões críticas (Reis, C., ed., 1993-2001; Alfa, ed., 2001-2003), Histórias da Filosofia (com riscos inerentes, a diligência global da ed. P. Calafate, 1999-2001, mais de um século após a exígua empresa de Lopes Praça), do Ensino (retenham-se R. de Carvalho, 1986, A. Nóvoa, 1987), Artes, Ciência, movimentos intelectuais e doutrinários, dicionários temáticos, actas de inúmeros congressos e simpósios, monografias, teses, projetos que enunciam qualitativamente a vida académica e cultural após a revolução de 25 de abril e que certificam, no conjunto, a fase exploratória, credora e correlata da democratização do ensino e da explosão da investigação científica que novas condições post 1974 e a adesão ao projeto europeu em 1986 permitiam. Ora, diga-se: disponível amplo suporte documental, empírico e teórico, falha ainda a sistemática visão transdisciplinar de um tentame que convoque sínteses diacrónicas da cultura portuguesa e que a libertem do pequeno círculo ensimesmado da «cultura nacional».
6. O ensaísmo, original, ágil hipótese, exercício crítico que coabita na dúvida cartesiana, na sinopse de Sílvio Lima (Ensaio sobre a essência do ensaio, 1944), exerce relevante diagnose e dialogia na criação das indagações da história da cultura, abrindo caminho e novas pistas, algumas depois empiricamente evidenciadas. Sob a inicial matriz de O. Martins e em diálogo com as suas teses, António Sérgio (1883-1969), doutrinário e paideuta, não pode ser expedido nos Ensaios para o sítio historiográfico que não buscou, ou apenas teoricamente o fez sem acartar investigação empírica, mas abriu indícios e problemáticas fundamentais da cultura, desde logo em «Espectros» (Ensaios [I], 1920) e «O Reino Cadaveroso ou o problema da cultura em Portugal» (1926, Ensaios, II, 1929), e na diversa exegética a autores, obras, temas essenciais, de Camões a Antero (é um dos anterianos da I metade do século, com J. Carvalho, Leonardo Coimbra, J. Bruno Carreiro) e Oliveira Martins, no ideal da paideia democrática e da cidadania, às constantes «divagações pedagógicas» sobre o sebastianismo ou o ideal humanista. No proémio da obra, condensava assim Sérgio o ofício (Ens. I, pref. à 2ªed.), com algum acerto: “Os caminhos da renovação que em nossa história iniciei consistiram muito menos nas interpretações alvitradas e nos trabalhos de análise com que pretendi aboná-las, do que na própria circunstância de querer interpretar e entender, do que na nova mentalidade com que encarava as coisas”.