Para Herculano, o valor da verdade em história – basilar na construção científica - sobrepunha-se ao culto de qualquer alegada tradição gloriosa não fundamentada historicamente em evidência documental. O historiador acentuava decisivamente a distinção história-mito. Reconhecendo o sentimento de lealdade patriótica como uma virtude, não deixava contudo de se precaver contra os seus efeitos nocivos na escrita da história: “O patriotismo pode inspirar a poesia; pode aviventar o estilo; mas é péssimo conselheiro do historiador. Quantas vezes, levado de tão mau guia, ele vê os factos através do prisma das preocupações nacionais, e nem sequer suspeita que o mundo se rirá, não só dele, o que pouco importará, mas tanbém da credulidade e ignorância do seu país, o qual desonrou, querendo exaltá-lo!” (A.Herculano, História de Portugal, 1846, I, p.16).
Note-se, no entanto, que Herculano sempre valorizou o sentimento de lealdade patriótica e defendeu a independência nacional em termos inequívocos, chegando até a posicionar-se em termos adversos em relação ao progresso material. Alguns exemplos: quando em 1838 não põe em causa o valor instrumental da tradição da Padeira de Aljubarrota, subalternizando o problema da sua autenticidade; quando, em 1853, em polémica com Lopes de Mendonça acerca da centralização, advertia para os riscos que poderia ter a construção do caminho de ferro do leste, que ligaria Lisboa a Madrid; ou já em 1861, ao subscrever um manifesto nacionalista da anti-ibertista Comissão 1º de Dezembro (S.C.Matos, Historiografia..., 1998, pp.298-299). Tal como os seus pares europeus – Guizot, Michelet, Macaulay, Lafuente, entre muitos outros – para Herculano os historiadores tinham uma relevante função social e cultural a cumprir na construção das nações modernas.
A Regeneração corresponde a um tempo de transformação do Estado e de introdução em Portugal de inovações tecnológicas, de reacção nacionalista à difusão de projectos iberistas, unitários ou federalistas. Vulgarizaram-se então centenas de artigos de imprensa periódica, manifestos, panfletos, livros de história, romances e dramas históricos contra a ameaça iberista (F.Catroga, “Nacionalismo e ecumenismo...”, 1985).