Godinho, que desde os anos 40 trabalhara para a renovação da historiografia da expansão portuguesa - através da publicação de documentação, da crítica das fontes e de uma reflexão teórica e metodológica elaborada à luz da historiografia europeia contemporânea (Annales) -, dando-lhe uma dimensão internacional marcada pela perspectiva comparativa e a pela sua constante integração na problemática da construção do mundo moderno, punha em evidência o uso político e ideológico da História ao serviço do Estado Novo.
Os anos 1959 a 1962 marcaram o fim de um período de grandes publicações como a História dos Descobrimentos de Duarte Leite, Os Descobrimentos Portugueses de Jaime Cortesão, e ainda, no registo da cartografia, a Portugaliae Monumenta Cartographica, que permitiram abrir caminho a novos estudos. Três obras inovadoras, de menor ambição e dimensão, surgiram, revelando novas perspectivas temáticas e metodológicas: Aspectos e Problemas da Expansão Portuguesa, de Orlando Ribeiro, Introdução à História dos Descobrimentos, de Luís de Albuquerque e a censurada Economia dos Descobrimentos Henriquinos, de Vitorino Magalhães Godinho.
Mas registe-se um facto singular: a questão da organização autónoma da história dos Outros nunca constituiu uma verdadeira preocupação dos historiadores portugueses, mesmo se a perspectiva universalista de Godinho pretendia abrir caminho a “uma nova maneira de olhar o mundo (…) [ao reconhecimento da] unidade dos homens na diversidade das suas sociedades e civilizações” (Mito e mercadoria…, 1990, 55). E já em 1947, Godinho afirmava que “impõe-se banir o europocentrismo que tem dominado a construção histórica, para que seja possível a autêntica história universal. O estudo de Marrocos, Canárias, Sáara, Guiné, Angola, Índia, China, etc., importa pelo conhecimento de estruturas diferentes da europeia e de linhas de transformação também diversas” (História económica e social da expansão portuguesa. 10).