O terceiro tipo de escrita histórica procurou devolver aos africanos o lugar central na história de Angola, embora deslizando frequentemente sobre as armadilhas decorrentes de uma ideologia muito fortemente enraizada no tecido cultural português. Um dos raros representantes desta escrita foi Norton de Mattos que reconhecendo a anterioridade da história dos angolanos sublinhava a absurda incomodidade do poder português perante esta realidade histórica. Criando uma espécie de espaço historiográfico onde ambas as histórias se articulavam, o general, referia a história portuguesa de Angola, iniciada em 1483, num território onde “havia [já] muitos séculos”, “povos com uma organização social que muito surpreendeu os descobridores e cuja história (…) é essencial conhecer, para bem se compreender o desenrolar dos complexos acontecimentos que, naquela região, se têm produzido, desde os fins do século XV aos nossos dias” (Mattos, Memórias e Trabalhos da minha vida, II, 1944, 27-28).
Norton de Mattos avançava com dexteridade num terreno histórico, minado pelas ideologias e pelos mitos, para salientar que a história de Angola era de facto «constituída pela análise das reacções e transformações que os seus antigos habitantes indígenas (…) experimentaram ao nosso contacto. Finalmente, a história da formação do território português angolano, tal como hoje existe, dependeu não só dos elementos africanos que se levantaram em obstáculo à expressão portuguesa, umas vezes derrotados, outras não, mas também de nações europeias que impediram a nossa [quer dizer, dos portugueses] livre expansão» (II, 27-28). Marcado por uma grande curiosidade, o não historiador Norton de Mattos, que confessava a sua fidelidade teórica a Proudhon, não podia repensar a organização de Angola sem recorrer à perspectiva lusocêntrica, aos factos e aos problemas coloniais portugueses, para definir os grandes eixos da história angolana (II, 28-29), mas não eliminou os africanos da organização histórica do seu país.