O segundo tipo de escrita, que reconhecia um lugar aos africanos em certas situações e contextos foi marcado pelo peso do lusotropicalismo. O Outro tornara-se indispensável para permitir a mestiçagem, sem a qual a história colonial portuguesa não podia ter a mesma densidade. A História de Angola (1929) de Alberto de Lemos, funcionário que ocupou lugares importantes na hierarquia administrativa de Luanda e organizou o Arquivo Histórico de Luanda (1937), consagrou uma visão lusocêntrica, versão lusotropicalista, revelando a articulação entre os fundamentos históricos legítimos da “causa colonial que continua ainda hoje a ser a sua [de Portugal] justificação principal” e o dever de “povoar e civilizar as suas possessões tão extensas, colaborando no progresso da humanidade em geral”, tornando-se a colonização “a função fundamental da nossa nacionalidade” (Lemos, 1929, 61).
Organizada em torno de acontecimentos que marcaram a vida portuguesa em Angola, recorrendo à analogia para manter uma fidelidade total à história de Portugal (a Batalha de Ambuíla é a “Aljubarrota de Angola”), Lemos mobilizou a mestiçagem, que praticou na sua vida familiar, para registar uma certeza histórica indiscutível: o papel preponderante das grandes famílias mestiças urbanas na formação e consolidação de uma Angola portuguesa. (Lemos, Nótulas históricas, 1969, 240).
A História de Angola de Norberto Gonzaga, publicada em Angola em 1963, com o objectivo de mostrar o papel determinante assumido por Portugal na história angolana, identificou um “período pré-colonial” anterior à chegada dos portugueses, sublinhando a existência do reino do Kongo e de acontecimentos centrados em figuras africanas como a rainha Njinga, para pôr em evidência a heroicidade dos portugueses, promotores do progresso e da mudança (1963,145). As denúncias da selvajaria africana (recorrendo ao canibalismo) e das agressões europeias aos direitos portugueses organizaram o discurso do autor, centrado em factos e temas reveladores de um lusocentrismo marcado já pela guerra colonial.