Uma via demasiado estreita da qual naturalmente emergiu a avidez por um pensamento filosófico que, a despeito de tudo, não prescindisse do contacto com a realidade viva, ou, na frase de Boutroux que Merêa sabiamente convocou, uma filosofia que representasse o legítimo produto de uma colaboração do espírito com as coisas. Daí em diante, Merêa construiu uma obra monumental, repartida entre a história das instituições e a história do pensamento jurídico. Aliou à fria severidade filológica dos textos a preocupação de emoldurar sempre a análise dos problemas histórico-jurídicos com os seus laços culturais, de molde a proporcionar explicações panorâmicas de conjunto. Versou Paulo Merêa um assombroso rol de temas. Cruzou, sem repouso, as áreas da história do direito privado e da história do direito público, para além de múltiplas incursões coroadas de êxito ao pensamento político nacional e europeu. Teve ainda o mérito de nos legar diversas sínteses expositivas da história do direito português. Não há réstia de exagero na afirmação de que foi Merêa o criador de uma verdadeira escola de história do direito, cuja influência não se confinou às fronteiras do nosso país. Contemporâneo de Merêa, Luís Cabral de Moncada revelou-se também um insigne historiador do direito, se bem que o seu compromisso de alma o tivesse conduzido preferencialmente à filosofia do direito. Uma ligação, aliás, que por si só explica o sólido arrimo filosófico com que abordou a compreensão da história do direito e o seu específico problema metodológico.
Todavia, o verdadeiro continuador do trilho aberto por Paulo Merêa foi, sem dúvida, Guilherme Braga da Cruz. Apresentou-se a doutoramento, em Novembro de 1941, defendendo uma dissertação que versava o direito de troncalidade. Lançou, então, a primeira pedra de uma extensa obra, com um primoroso estudo jurídico do princípio troncal, onde não se esquecia de dedicar uma enorme atenção a dois institutos que lhe estavam relacionados pelo fundamento histórico e sociológico que os inspirava: o retrato familiar e a reserva hereditária. Depois, ao longo de uma vida de infatigável labor, cultivou um considerável espectro de temas, inscritos no direito antigo e medieval, mas também nos alicerces do direito português moderno. Uma produção que ostenta um extraordinário apuro científico. Senhor de uma grandeza moral e de uma estatura intelectual que fizeram dele o símbolo do homem universitário do seu tempo, Braga da Cruz deixou impressos na lembrança de todos quantos o conheceram os contornos de uma personalidade ímpar.