Relativamente à determinação transcrita, Mello Freire converteu-se no seu executor compendiário mais destacado. Entretanto, os atrasos sucediam-se. É certo que o primeiro lente de direito pátrio após a reforma pombalina, Joaquim José Vieira Godinho, se lançou a compor uma História da Legislação Portuguesa, mas, segundo parece, não terá chegado a servir o ensino universitário. Por outro lado, não se ignora que, na sequência de uma ordem saída da Congregação da Faculdade de Leis, em 13 de Dezembro de 1786, coube ao lente substituto Ricardo Raimundo Nogueira a tremenda missão de elaborar vários compêndios que experimentariam uso em diferentes cadeiras. A magnitude da tarefa que caía sobre os ombros de Raimundo Nogueira ficou justificada, por se entender que os manuais deviam ser feitos por uma só pessoa em nome da uniformidade de princípios e de doutrinas.
Ora, naquele vasto conjunto de incumbências, estava exactamente inscrita a redacção de um compêndio «da Historia do Direito Romano e Patrio». Só que, muito provavelmente, Mello Freire estugou o passo na mesma direcção, tomando a dianteira ao seu ilustre colega. Surge assim, editada em 1788 por iniciativa da Academia Real das Ciências; a famosa Historiae Iuris Civilis Lusitani Liber Singularis, da autoria de Pascoal José de Mello Freire dos Reis, que viria a receber consagração oficial para o ensino. Em todo o caso, Ricardo Raimundo Nogueira não soçobrou no projecto original, pois do seu magistério resultaram umas valiosas Prelecções sobre a Historia do Direito Patrio, mas a prioridade no tempo é implacável e isso não evitou que o futuro coroasse Mello Freire como o «fundador da história do direito português».
Alimentando correntes de opinião assaz progressivas em vários domínios da cultura, os intelectuais portugueses fora do cenáculo universitário deixaram de engolfar na noite e na morte. Por esse tempo, preluzia peregrinamente a Academia das Ciências de Lisboa, criada em 1779, e cujo intenso labor fez, em rápido compasso, avançar muito o conhecimento da história jurídica. No claustro universitário conservou-se, bem vivo, o interesse pelas sucessivas fontes cognoscendi do direito português. Ao ponto da Real Imprensa da Universidade de Coimbra ter promovido, pelos fins do século XVIII, uma aparatosa publicação que incluiu as Ordenações Afonsinas, as Ordenações Manuelinas, a compilação intercalar que foi a Colecção das Leis Extravagantes de Duarte Nunes do Lião, as Ordenações Filipinas, vários volumes dedicados à legislação avulsa posterior a 1603, e uma colectânea de assentos dos tribunais superiores, a saber, da Casa da Suplicação e da Casa do Cível.