Não abdicando de um estilo acessível que lhe garantisse uma adesão minimamente expressiva, a antiga Impressão Régia patrocinaria edições seriadas do mesmo tipo, como “Biografias, apreciações e narrativas”, mas, sobretudo, “Portugueses fora de Portugal” e, em plena crise ultramarina, “Descobertas e descobridores”, em que Luciano Cordeiro, não por acaso um dos fundadores da SGL, veio a publicar parte da sua investigação. Facto não despiciendo, alguns destes volumes conheceriam mesmo novas edições já sob a égide da Agência Geral do Ultramar ou da actual Imprensa Nacional.
Desenhava-se, assim, um modelo de popularização, e mesmo de intervenção cívica, mais em sintonia com o movimento de especialização do trabalho historiográfico. Um modelo menos directamente propagandístico e preferencialmente voltado para um passado mais remoto e menos tingido pelas lutas intestinas que atravessaram o século até à Primeira República, ainda que fosse a actualidade política, como a questão colonial, a marcar-lhe o compasso. À imagem daqueles que, em clima de profunda alteração do sistema político, se viram receber honras de monumento, nomeadamente através da publicitação da sua história de vida, os heróis do passado tornavam-se heróis do presente. A empenhada recuperação, especialmente em época de comemorativismo, de narrativas heróicas, que contavam como protagonistas com Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, Luís de Camões, Nuno Álvares Pereira e o Infante D. Henrique, entre outros, constituiu, afinal, a face mais acentuadamente histórica de um discurso, ou de discursos, sobre o estado presente e futuro do país. O caso profundamente polémico do Marquês de Pombal – “o português mais historiado de Portugal” –, ora “génio” ou “grande homem”, ora “vilão” ou tão-somente “figura notável”, foi sobretudo sintomático de um modus generalizado de personalização da disputa ideológica, pelo inusitado volume de publicações biográficas que lhe foram dedicadas. (Alfredo Duarte Rodrigues, O Marquês de Pombal e os seus biógrafos, 1947)
Produto do seu tempo, o perfil dominante do autor de trabalhos biográficos, mesmo daqueles em que a originalidade (de investigação ou de abordagem) se sobrepunha ao intuito divulgador, trazia a marca de um clima político especialmente favorável à intersecção entre labor erudito e intervenção pública.