Nela, ainda mais que no ambiente restrito da academia, se situou o fundamental da reflexão sobre o papel do indivíduo nos processos históricos. Desta circunstância dava sinal o jornalista e político Luís de Magalhães, ao se referir aos artigos que o seu antigo companheiro de armas e mentor, Oliveira Martins, publicara n’A Província, o jornal que serviu de órgão ao movimento da Vida Nova: mais que “escritos políticos”, “batalhas de princípios e ideias governativas” – que também o seriam –, eles eram, dizia, “pequenos trabalhos de história, – história do passado ou história da actualidade, – estudada [na] psicologia dos homens que a propulsionam e a norteiam com as suas ideias, os seus sentimentos e as suas acções.” Na colectânea destes artigos que veio a ser editada, já depois da morte do seu autor, sob o sugestivo título de Perfis, conviviam figuras nacionais com outras estrangeiras, como o quisera Garrett no seu plano educativo de um “Plutarco da mocidade”. Os artigos sobre heróis militares, estadistas e intelectuais nos quais Oliveira Martins reconheceu a excepção – Pombal, Saldanha, Garrett, Antero, Napoleão, Luís da Baviera, Gladstone, Renan,... – não foram senão o ensaio para as suas obras biográficas maiores e aquelas que, ainda hoje, lhe creditam grande parte dos louros. Mas naqueles de forma ainda mais expressiva, porque mais próxima do biografismo do seu tempo, encontrava-se já uma concepção – ecléctica, porém – de história e, em particular, da agência humana, a qual largamente ecoava os debates em torno da noção de grande homem, e de herói, que tingiram a produção biográfica mais relevante da segunda metade de Oitocentos, dentro e fora dos circuitos académicos. (L. Magalhães, “Oliveira Martins: o historiador e o politico”, 1930, p.ii)
Em Oliveira Martins como noutros, é especialmente sintomático o modo sincrético como compunham variações sobre a tese voluntarista, tão em voga à época. O debate sobre a concepção de grande homem, que no final do século ocupou a linha da frente da teorização historiográfica em torno da agencialidade, nunca ofereceu visões bem delimitadas. De certo modo à semelhança da abordagem de Herculano, quando este, a despeito de contrariar a história dos reis e das dinastias montada sobre figuras singulares, na prática sublinhava o papel da vontade e das motivações individuais como factores explicativos, nunca a grande personagem se conseguiu divorciar do colectivo que lhe servia de referência ou, sequer, dos condicionalismos à sua acção que o meio social lhe impunha.